Tuesday, March 19, 2019

Sobre isenções, subsídios e legítima defesa.

    A melhor definição sobre isenções e subsídios que eu já li é a seguinte:
    Isenção é deixar de tributar a Paulo. Subsídio é tributar Paulo para dar a Pedro.
    Nenhum dos livros de direito que eu já li fornece uma definição que melhor contempla a realidade desses conceitos no nosso truncado sistema tributário. As duas possuem natureza marcadamente distinta e é bastante útil que um defensor da propriedade privada a isso se atente.
    Por vezes as críticas que procedem de intérpretes mais liberais buscam se posicionar contrariamente aos dois fenômenos. Vamos exemplificar a partir de duas situações distintas o por quê de, ao contrário da política de subsídio, a política de isenções não constituir nenhum agravamento aos direitos naturais.
    Vamos exemplificar o subsídio a partir do programa minha casa minha vida. No site da Caixa Econômica vê-se a seguinte definição:
O que é o subsídio?
É um valor que o governo dá para pessoas com baixa renda e que é usado para diminuir o valor financiado. Imagine uma casa no valor de R$ 150.000,00 e uma pessoa de baixa renda para comprá-la. Se for feito o financiamento comum, o valor da prestação ficaria muito alto, então o governo oferece um subsídio de R$ 25.000,00 (isto é apenas um exemplo), assim o valor a ser financiado não é mais R$ 150.000,00 e sim R$ 125.000,00.

    Nesse ponto note que se trata de um programa de transferência de renda. No caso você e eu seremos compelidos pelo fisco a repassar 25 mil reais em créditos ao fulano aleatório usuário do programa governamental. Não se trata de um ônus que o estado poderia impor ao adquirente e opta por não fazê-lo, mas sim que nesse caso para complementar o pagamento do valor do imóvel essa quantia é rateada entre todos os outros pagadores de impostos.

    E a isenção?

    Particularmente para estatistas os dois fenômenos podem ser vistos como muito próximos, mas nada está mais longe da realidade.]
Observe o que ocorre no caso da isenção operada nas compras de veículos por pessoas com deficiência. Cumpridos certos requisitos, pode o cidadão adquirir um veículo de fabricação nacional e de valor não superior a 70 mil reais sem que a compra seja maculada pelo IPI, ICMS e em certos casos IPVA.
    Isso tende a deixar a relação de compra e venda um pouco mais próximo do que seria uma relação de mercado, ou seja, produtores estabelecendo preços pela mercadoria conforme estas são demandadas pelo consumidor.
    Dizemos "próxima" pois ainda assim o mercado brasileiro de automóveis é sovieticamente regulado, em um cenário onde o governo central protege suas empresas favoritas no que pode ser chamado "capitalismo de compadrio", ou meramente corporativismo.
    Com tais reservas de mercado os preços praticados no Brasil estão muito aquém de uma autêntica formação de preços de livre mercado, o que resulta em produtos mais caros e de qualidade pior para o consumidor.
    O ponto é, mesmo que o governo não reivindique uma fatia dos preços dos veículos para si próprio, deixando de cobrar impostos em casos específicos, ele ainda distorce a demanda e oferta culminando no encarecimentos dos produtos finais.
    Nesse cenário a opção por pagar um valor menor diretamente ao empresário e afastar uma espoliação estatal na casa dos 20 ou 30% não só é ato legítimo, como também deve ser considerado insuficiente. Na verdade tais isenções deveriam ser imediatamente estendidas a todos os consumidores.

    E o governo? Este não tem qualquer direito natural à praticar espoliação contra pessoas pacíficas, e tão pouco reconhecemos alguma legitimidade das normatizações positivistas que são no fim das contas uma formalidade pela qual o estado julga lícito o roubo quando praticado pelos seus agentes.

    Recentemente uma porta voz do governo Bolsonaro chegou a declarar como um "privilégio" esse tipo de isenção. Alguns agentes do estado chegam até a divagar sobre como os deficientes estão onerando o estado ao serem isentos na compra de veículos, este estado que tanto precisa de recursos para saúde e educação... (foi exatamente este o conteúdo de uma curiosa sentença que para minha infelicidade tive a oportunidade de ler).

    A situação revela toda sua malignidade quanto mais o cidadão pacífico aplique a matemática ao caso concreto.
    Para ilustrar, contemple o caso de alguém que paga 4% ao ano sob o valor do veículo à título de IPVA. Ao ser espoliado nesse quantum anualmente, ao fim de 20 anos o estado terá recebido 80% do valor total do automóvel.
Em outras palavras, é como se o estado firmasse com você o seguinte pacto: eu estado mui benevolentemente concedo-te o direito de negociar um carro, bastando para isso que você me oferte gratuitamente veículo semelhante.
    Parece um diálogo que teria ocorrido numa ficção de um rei maligno e despótico mas é só o tal do "contrato social" posto em prática.

    Nas palavras de Hans-Hermann Hoppe, quando o estado age redistribuindo títulos de propriedade, o estado está praticando socialismo. Por conseguinte, qualquer programa de transferência de renda onde a população é compelida a financiar bens para outras pessoas escolhidas pelo governo será sempre um ato antiético e condenável. Este é o subsídio, e este é o tipo de mecanismo tributário que um libertário deve fazer oposição.
    Já quanto às isenções por serem mero ato de renúncia estatal devem ser sempre comemoradas e assim que possível ampliadas.

    Portanto, por ser um autêntico ato de legítima defesa, deve sempre o cidadão lançar mão de qualquer ferramenta disponível para impedir que o estado se torne usufrutuário dos bens privados.

Notas
Como funciona o subsídio da Caixa e quem tem direito? Caixa econômica federal. Disponível em: <https://www.casadicas.com.br/financiamento/como-funciona-o-subsidio-da-caixa-e-quem-tem-direito.html> acesso em 19 mar 2019.
Isenção para deficiente comprar carro é privilégio, diz secretária. Folha de São Paulo. Disponível em: <https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2019/03/isencao-para-deficiente-comprar-carro-e-privilegio-diz-secretaria.shtml> acesso em 19 mar 2019.

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